domingo, 15 de fevereiro de 2015

Mas é carnaval

Esse ano decidi ficar fora da folia. Nos últimos tempos essa data foi sempre intensa para mim, repleta de momentos que combinavam com a alegria e euforia do carnaval.  Dias felizes, embebidos na mais pura ilusão. Desde a decisão de “sair do armário” aquela tarde distante em Santa Tereza, passamos por muitas fantasias, brilhamos, brincamos, até nos pintarmos com as cores do pavão de Krishna, no ano passado: “No carnaval te conheci/ transcendental te segui...” Foram bonitos aqueles dias de chuva, suor e cerveja pelas ruas e praças. O carnaval crescendo, o amor crescendo, as ruas se enchendo e a gente vendo tudo aquilo, com um orgulho e uma esperança enormes na cidade, nas pessoas e em nós mesmos. Minha carne sempre foi de carnaval.

Agora que a paixão maior se foi (sei que um dia vai voltar mas demora tempo) recolho-me à solidão da minha casa em companhia de minha mãe. Longos silêncios e reflexões sobre a vida. Sobre o amor. Sobre viver sozinha. “Você não tem medo de ficar aqui sem ninguém?” Respondo como Diadorim: “Costumo não.” Mas por dentro sei que às vezes tenho medo sim. De mim.

De longe vejo a alegria dos outros pulsando na tela. Já é carnaval. Sorridentes, coloridos, desafiantes. Vem? Vou não. Hoje não. Antes preciso me curar da ressaca do último baile. Confesso que exagerei.
E permaneço firme na minha decisão. Até que escutei minha mãe chateada dizer: “Só porque tenho quase 85 anos ninguém quer me levar ao carnaval.” Aquilo ecoou em mim. Envelhecer tem sido uma questão que me toca todos os dias. “Talvez a gente consiga alguma coisa aqui no Serrano, mãe. Eu te levo.” Mas falo sem acreditar muito. E então fico sabendo que aqui no bairro, bem pertinho da gente, a querida Rose, minha amiga e parceira de vida e luta, fundou o Bloco das Primas. E que vai ter cortejo pelas ruas do bairro. Ah...Rose! Só você mesmo pra me fazer mudar de ideia, ainda que com o coração sujo de confetes e serpentinas antigas.

Domingo cedo saio em busca de um turbante, coloco uma saia estampada, arrumo uns colares pra minha parceira, pintamos o rosto e lá vamos nós. No caminho esboço um sorriso, respiro fundo e lembro-me do meu pai cantando pra mim, há muito, muito tempo atrás: Loirinha, loirinha / Dos olhos claros de cristal...


Resta uma esperança. Outros carnavais virão. Mesmo triste aceito o convite do moço que passa: vamos brincar?

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