domingo, 1 de março de 2015

Preparação

Ontem dormi antes das dez, com o gato nos pés da cama. Isso tornou o sono leve, com medo de machucar o bichano, pequeno companheiro nessa aventura de fazer da casa amarela um palco.
Acordei cedo, na ansiedade de ver tudo logo arrumado, a dona de casa eficiente e rápida me invade. Calma, digo pra mim mesma. Aos poucos vou conseguindo domá-la. Tomo café mais reforçado, nesses dias nem consigo almoçar, preciso estar faminta. Parece que inversamente é o estômago vazio que garante a energia, o chacra solar é o mais ativado. Domingo é um corpo em ação e reação. Um corpo queimando. Acendo um incenso e rezo no pequeno altar. Nenhum pedido hoje. Pedi tanto nos dias anteriores. Reza que sara da loucura, já diria mestre Rosa. Acredito. Mas hoje só agradeço. Recebi muito.
Vou à rua comprar coisas que faltam para o preparo dos alimentos. Broa de fubá com goiabada e pão de queijo. Com o ar fresco no rosto, observo o domingo de cada um no caminho. Dia mais lento, mais leve? 
Depois varro o passeio em frente ao quintal e toda a casa. Passo pano em cada cômodo, gosto de arrumar onde habito. Ajuda a organizar meu caos interior. Quero que as pessoas gostem daqui, se sintam acolhidas.
Aplaino a terra, lavo os vidros, escolho um pedaço de carvão, deixo perto do muro. Encho a bacia de água. Separo o papel do barquinho. Coloco os vestidos no lugar.  
Na cozinha começo a fazer as comidas. Penso, penso, penso. Como gostaria de meditar por horas e não precisar “pensar”. Mas penso. A diferença é que agora existe uma calmaria. Um compreender. Um olhar mais generoso comigo. Tudo isso é fruto da solidão dos domingos e desse Domingo que hoje se abre para outros.
Já me sinto feliz por ter conseguido. Junto com a Denise, amiga essencial. Ela está comigo em cena. E tantas outras mulheres. Familiares, parceiros e amigos acarinham, escrevem, apoiam. Tocar as pessoas fortalece, impulsiona. Repenso a arte, o teatro que faço há tantos anos. Que bom ter conseguido não desistir. Tudo que vier agora é soma. É vida nova em seu fluxo infinito e belo.

Lembro-me do conselho de Hamlet aos atores: “Ide preparar-vos”.
É o que faço agora.
O resto é medo e coragem.

Bom domingo.

Um comentário:

  1. Bom-dia, Cida! Também, pela manhã, li a matéria sobre o espetáculo "Domingo", no jornal O Tempo. O poema SEM FIM me deixou sem fôlego. Como colocar tanta coisa em apenas doze versos. Conciso, e vasto, e denso,e completo... Desejo sucesso na sua estreia. Gostaria muito de assisti-la hoje, mas sei que os ingressos já devem ter-se esgotado. Receba o meu abraço.

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