domingo, 31 de maio de 2015

Dia de.



Fazer o domingo de novo é arrancar a pele pra que a carne viva. 
Cavucar a terra até que a mãe sangre.
Bater no peito pra lembrar da dor. 
Espatifar os vidros das garrafas solitárias, no fundo da casa. 
Deixar o choro de misturar ao solo, regar o mato. Esse que cresce. Sempre.  
Beber a água suja da bacia-mar. 
Com paciência fazer o barquinho de papel, como se fosse brincar.  
É se ver no espelho ainda forte. 
Preparar a broa e esperar seu perfume. 
Incensar a casa cantando. 
Cuidar das roupas e das pequenas lembranças para que nada falte. 
E virar a Dona Doida. A que mistura Tristeza com Alegria.
E  lembrar da doce Cora e suas roseiras. 
E chamar Clarice puxando o traço do delineador. 
Trazer Frida para a mesa do I Ching. 
Lembrar das mulheres da minha ancestralidade. 
Evocar minha doce avó Páscoa. Esperar meu duplo: a mulher xamã. Receber a garota de cabelos curtos, suave. E a moça das tatuagens que me enigmam. Companheiras. 
De extremos faço meu domingo.
 De delicadezas e pequenas violências. 
De ar e fogo. Quente e frio. Coturnos e pés descalços. 
Que seja mais um dia do resto de nossas vidas, ainda que a vida não tenha necessariamente um resto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário